terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Eu, mulher


"... NADA NEM NINGUÉM tem o direito de me desrespeitar ou me ameaçar porque sobre o meu corpo e as minhas roupas EU DECIDO. É meu espaço, é meu direito e ninguém pode tornar a mulher culpada por sua liberdade quando a mesma sofre uma agressão."

É impressionante como está naturalizada a agressão contra a mulher. O desrespeito e a opressão. Sexta-feira véspera de Natal e eu consegui esgotar minhas frases-prontas (de uma mulher que já está acostumada a "receber a atenção" de babacas machistas que sentem a escrota necessidade de gritar adjetivos e outras coisas nojentas rua afora) de resposta a esses ataques.
Mulher tem que aguentar? Ah, é só um elogio e eu devo agradecer, é?! Ficar lisonjeada que porcos me acham uma delícia e querem "me chupar todinha" (reprodução fielíssima de um dos idiotas da noite passada)?!?!

Quando saio sozinha, faço questão de deixar a parte raspada da cabeça a mostra, uso coturnos e sempre que posso, canivete suíço ou spray de pimenta estão em lugar de fácil acesso. O cigarro aceso chacoalhando na mão direita sempre que dá; a brasa também é protetora.
A passada é máscula e o olhar, franzido.
Quando não é assim, sou obrigada a encontrar graça, pra não estragar a noite ficando emburrada. Respondo com piada, faço graça, pra encobrir o constrangimento e frustração. Para afugentar a raiva.

Todos os dias eu (e muitas outras) sou agredida verbalmente. Todos os dias eu mostro meu dedo médio, chamo de pau-pequeno, menciono a pobre mãezinha deles em tentativa (vã) de forçá-los a perceber que ela é tão mulher quanto eu e ele poderia estar desrespeitando a ela também.
Todos os dias senhores de cabelos grisalhos e net@s para cuidar, trabalhadores cansados, funcionários, ciclistas, filhos e pais olham como a quem analisa qualidade de cavalos a venda. Nem se intimidam mais quando encontram meu olhar de desagrado. Quando bufo, suspiro e coço a garganta em bom tom. Apenas tornam o olhar de volta ao que lhes interessa.
Na balada, pra evitar as encoxadas constantes, dançava de braços abertos, parecendo uma pomba-gira...
Sofri tentativa de estupro e minha única reação foi proteger meu rosto com os braços e me encolher quase que em posição fetal. PA-TÉ-TI-CO.
Hoje eu monto uma personagem, mantenho a mente alerta para estar pronta para reagir ao contato. É impressionante o nível ao qual chegamos.

E pensar que tenho conversas recorrentes a respeito de estupros. O que eu falaria para tentar convencer o agressor a não realizá-lo se um dia eu viesse a sofrer um. O que falar para mexer com seu ego, para menosprezá-lo, minimizá-lo ao máximo, assim como ele tenta fazer comigo. Mexer com a idéia de poder que ele tem sobre mim.
Quando minha amiga me ligou de madrugada dizendo que havia ido ao motel com um estranho que conheceu na rua, pensei em pedir que ela respondesse "azul" se estivesse em perigo ou "amarelo" se estivesse tudo bem.
A mulher não é livre...

Há quem dirá que eu exagero. Eu digo: Como posso não me indignar?! Exagera a mulher que se submete a isso e finge que não vê. Exagera a mulher que sorri de canto, de fato se sentindo lisonjeada, tamanha baixa auto-estima..
Quando que a mulher virou produto de consumo imediato?
Agora eu venho com uma placa escrita "Coma-me agora" ou "Eu o desejo, só não sei ainda, por favor, me conquiste com suas palavras doces e gentis"??

Nunca fui muito defensora da causa feminista. Acho que o preconceito contra a mulher está tão arraigado na sociedade de consumo, da sociedade mercantil que este só nos deixará de vez quando superarmos esta sociedade, e não ao contrário. Lutar pelo socialismo e entào o machismo, racismo, etnocentrismo, xenofobia, homofobia, etc cairão. Mas as vezes a frustração atinge seu limite.
E é, isto é um desabafo que não mudará o mundo, nem tocará os coraçõezinhos dos que praticam e aceitam esses abusos todos os dias... Isto é um desabafo de quem se segura para não agredir fisicamente ninguém, somente! Não é uma manifestação, um protesto, um ato. Isso a gente faz na rua, onde atinge, onde incomoda.
Isto é só um desabafo de quem não se conforma.

A citação vem do otimo texto que ficou na minha cabeça por alguns dias: O dia em que tive medo de ser mulher

2 comentários:

Anônimo disse...

Você me fez sentir essa dor.


Eu tenho vontade de te abraçar.

FlapLop disse...

Poxa anônimo, eu não sei como reagir à essa sua reação. rs
Mas confesso que quando escrevi isso, talvez tivesse apreciado um abraço.
(: