quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Eu, mulher, cúmplice?


"É verdade que o mundo  tornou-se  insensível às tragédias humanas. A distância entre nosso Eu anestesiado pela avalanche de informações, pelo consumismo e pelo comodismo e aquele Outro que sofre exclusão, fome e miséria funciona como um escudo que protege nossa sensibilidade da dor por algo que julgamos fora do nosso alcance resolver. Até certo ponto, isto é um mecanismo de defesa da Vida, porque ela quer viver apesar de tudo o que conspira contra ela. Contudo, há coisas cuja magnitude provoca a penetração para além desse escudo e, se ainda nos resta alguma sensibilidade, exige uma tomada de posição. Porque se o nosso egoísmo nos impede desta tomada de posição, nos impede também de ter dignidade, considerada por Kant como o diferencial dos seres humanos face às outras espécies animais." (Marta Guerra, Jornalista. Tolerar o intolerável é tornar-se cúmplice)
E é incrível como certas coisas podem afetar-nos psicologicamente.
E sem me apegar a moralismos e valores, máscaras e falso puritanismo. Não sou virgem maria, nem vou pro céu, se quando eu morrer ainda houverem tantas condições para ser aceita ali.

Eu cheguei a invejar e sentir raiva, quando via meninas passeando tranquilamente, semi-nuas, bêbadas ou sem erguer o olhar para os rostos que vêm a cruzá-las por aí. "Essas meninas ingênuas..." ou "essas sortudas...".
Elas não passam pela paranoia constante, pela montanha-russa de sensações e a agressividade a qual me forço a sentir para o caso de algo vir a acontecer.
Meninas que não percebem os olhares famintos na pista da balada, o roçar de membros estranhos é sempre acidental, o banho de sol não as faz se sentir exibicionistas em uma praia de voyeurs.

Eu troco de lugar com elas quando um velho no samba brinca com o homem mais próximo, que vai passar a mão na bunda delas. Eu viro as costas e dou leves cotoveladas. Fecho o círculo e empurro delicadamente. Não quero estragar o rolê, então me contenho. Mas o incômodo nunca passa.

Eu devo me entregar a ignorância forçada, proposital? Devo fingir que não percebo e ser complacente, indiretamente me cumplicizar de todos os ataques a todas as mulheres?
O mundo já é hipócrita demais. Eu já sou hipócrita demais...

Um comentário:

Thaís disse...

Que foda, Flá... me pôs a pensar...