VIII.
O que ela só sabe ser
Eu
já disse o quão bonita ela é. Poderia dar detalhes estéticos apurados e
analisar a forma como ela aparece no mundo; seus trejeitos, a forma como anda,
senta, move-se, a maneira como tem em seus cabelos loiros e repicados por
minhas mãos, em ondulações alucinantes, toda sua feminilidade freudiana, o
jeito que geme quando se espreguiça e o som de sua voz quando se propõe a pedir
que faças algo por ela. Não chegaria a ilustrá-la de forma minimamente justa.
Sua
mãe contava-lhe uma fábula sobre duas borboletas. Uma era amarelinha e pálida,
frustrada em sua aparência franzina. A outra, ah! A outra era duma gama de
cores extravagante, frascária, digna da fascinação de qualquer um que em sua
presença.
Gabava-se
a borboleta colorida à amarela, que se via farta de inveja e auto-comiseração
de toda a sua ordinedariedade perante a borboleta estrambótica.
Então
um dia parece uma lagartixa faminta e, enxergando somente a borboleta colorida,
abocanha-lhe a vida num golpe, encerrando toda sua estróina existência,
deixando de lado, ali, imperceptível, a borboletinha de cor tão vulgar.