sexta-feira, 6 de abril de 2012

Sono

- Ali, não tá ouvindo?

- Ouvindo o quê?! Volta a dormir, gatinha...
Eu odiava que ele me chamasse de gatinha. Não era assim, 'gatinha'; Era tipo um miado de gato no cio; Gatchénha... Urgh.
E como eu poderia dormir, com aquela barulheira toda? Parecia até deboche, que ele conseguisse dormir tranquilamente, enquanto eu me agoniava em reação àquilo tudo.

- Não consigo...
Então ele abriu os olhos. Parecia um estalo, como se saísse de transe, olhando para o teto, ambos imóveis - o teto e ele. Me perguntei se ele mesmo, aquele que acordava, ra quem havia falado há pouco comigo.
Me arrepiei com a idéia e tentei tirá-la da cabeça. Fechei os olhos e virei-me para o outro lado, tentando ignorar o passarinho que insistia em cantar fora de tom e o olhar de meu amante que havia me assustado.
Que besteira... Pensei comigo mesma. Uma risadinha incontida.
Respirei fundo e aconcheguei-me.

Minutos de silêncio se sucederam. Ainda pensava na humanidade e estranheza daquele que dividia a cama comigo. Aqueles momentos em que tudo me incomodava, tudo parecia estranho, assustador, ridículo.
Ainda ouvia aquele pássaro maldito a cantar sem harmonia, e nem me dava mais ao trabalho de tentar fazê-lo notar. O que quer que estava ao meu lado há alguns minutos atrás não pôde ouvi-lo, então ainda não o poderia, e isso só me incomodaria mais.

- Não dormiu nada ainda né?!
Virei e olhei-o. Calou-se. Não foi proposital, mas imaginei que ele já sabia minha resposta. Como consegue dormir com alguém assim? Sei lá. Mas quis afastar esse pensamento de mim também... Suspirei
O passarinho cantou. Suspirei.
- Vem aqui... Sossega um pouco, vá!
Puxou-me facilmente com os braços fortes aos quais ainda me acostumava e aproximamo-nos o suficiente para trazer calor um ao outro.
Arrepiei-me e tentei disfarçar. Numa mistura de sonho e noite, abraçamo-nos e acariciamo-nos novamente, de olhos abertos e fechados, segurando suspiros e gemidos.

Quero ver esse passarinho cantar desafinado para mim de novo!

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