Eu me lembro do cheiro do estúdio. De quando eu abria a porta, desvencilhando-me da fumaça da água fervendo para o café, de passar pelos badulaques pendurados nos batentes, das cabaças semi-serradas, das conversas esquisitas.
Mas mais especificamente, mais sensorialmente; Me lembro do cheiro ácido, pouco conhecido, característico. Era o cheiro do inédito. Do novo, desconhecido futuro. Futuro brilhante, ofuscante, misterioso.
Me lembro do cheiro dele, meu, das meninas, dos vizinhos, das visitas. Todos juntos. Acabanados. Agarrados nos outros cheiros novos dos todos-os-dias; Da lata de massa corridda que era aberta, do perfume novo da menina calada, da madeira recém lixada e da serragem que sobe e reflete na luz das manhãs. Cheiro dos livros na estante, daquela meleca que limpava o tablet, das telas... Ah! O cheiro da tinta a óleo, da essência de terebentina, das canetas permanentes, atômicas e a base de água.
Eu me lembro muito bem do cheiro do estúdio. Lembrei-me hoje, inspirei-me hoje; Pois sentei-me em frente a uma tela em branco, peguei meus pincéis e, encarando-a, respirei fundo, ao passo que abria o material ao lado. Inspirei e expirei; Inspirei memória. Inspirei inspiração.
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