Um velho acena-me. Homem. Velho.
Poderia descrevê-lo a vocês. Vestes, feição, trejeito, se
canhoto ou destro. É, aprendi a prestar atenção nestes detalhes. Mundo vil hoje
esse que vivemos, vil e seco, olho pintas, cicatrizes, cor e marca de
vestimenta. Vai que ele me assalta, me seqüestra, ou pior, pergunta-me se vou
bem. Dirijo a noite e por vias macabras. São as que mais me dão grana. E de
onde tiro clientes menos afetivos, assim corro menos risco de precisar falar que
acho dos flanelinhas e trombadinhas vagabundos que enfiam suas mãos sujas pra
dentro do meu vidro que já tá limpo, porra! Não sei como nunca vêem, aquelas
pragas.
(e suas mães putas que dão tanto que párem em ninhada. Daí
largam tudo nas ruas pra trazer dinheiro "pra cumê". Só se
"cumê" for gíria de pobre pra se picar. Tudo sempre igual!)
Daí aquele dia, puto dia... Acenou-me o velho e antes eu
tivesse passado reto. Odeio velhos. Fétidos... E sempre querem os centavos
certos de troco, daquelas notas suadas que tiram de seus bolsos criolinados.
Tive dó, velho decrépito todo cambaleante. Devia ter gozado alguns momentos
antes naquele puteiro bonito na Rua Quinze e eles o enxotaram logo, porque
velho gozado não é bom pra imagem de puteiro fino. Mesmo se um velho
endinheirado. Mesmo endinheirado, velho é raça podre. Não tem grana que
disfarce tempo perdido, eu acho.
(quero morrer antes de ficar velho, amargo louco, fardo.)
Precisei descer do carro para abrir-lhe a porta.
Quis ir no banco da frente, disse que era mania. Mania de velho tem que
respeitar, né? Pelo menos de velho pagante. Preciso dizer a vocês, eu odeio
velhos, mas gosto do seu dinheiro. Não me levem a mal, não sou de todo ruim,
olha só; Também gosto de imaginar pr’onde estou levando-os, de onde vêem,
porque vão-se, especialmente daquelas ruas sombrias àquelas horas. Na minha
cabeça, sempre boas histórias, ah! Se aqueles degenerados todos soubessem o que
se passa aqui na caixola fértil que tenho... Acho que se ofenderiam. Foda-se.
Fodam-nos.
Enfim assentado o velho homem perguntei-lhe o destino.
Péssima pergunta. Velho gosta de viajar na batatinha. Poderia contar-lhes o que
ficou a me dizer tanto tempo enquanto dirigia sem destino, girando o taxímetro,
mas vou poupar-lhes porque a essa hora eu já queria era socar-lhe a fuça e que
se foda sua grana criolenta, nada paga meu tempo perdido. Mas sou homem de bons
modos e deixei-o falando suas asneiras até que se lembrasse de que tava numa
porra dum táxi indo pr’algum lugar que não sua memória de merda e seu passado –
dis e re – torcido. Daí me disse pra seguir norte. Chavão, já sabia que ia me
tomar a noite toda, maldita hora em que parei. Eu devia confiar mais nos meus
instintos, e meus instintos ignorados disseram-me para não parar pra decrépitos em ruas
obscuras em além-horas... Levei o velho puto por quilômetros, e já estava até
conseguindo esquecer o quanto eu odiava-o e a todos de seu tipo. O taxímetro
marcava o tanto que tirava no meu melhor mês, e ainda era dia 05, eu tava quase
saltitando alegremente todo viadinho, não fossem as historietas anacrônicas
balbuciadas sem parar. Nem desconfiei. Bolso nenhum carregava tudo aquilo de dinheiro e eu
não aceitava cheques desde aquela vez que uma puta gostosa de batom roxo me
deixou de saco doendo e me sacaneou todo.
Daí já tinha se passado horas e o velho lembrou-se de voltar
pro mundo real, enquanto eu pensava o que faria se ele me sacaneasse também.
Pensei de um cuecão pela memória da minha infância, só pra acompanhar aquela
nostalgia toda do caralho do velho, até numa apagada e cova cavada na beira daquela
estrada, mas ainda cogitava se valia a canseira, considerando que eu teria mais
um monte de horas de caminho de volta, e a gasolina, e o motel pra descansar os
olhos e... Bom. Tendo voltado, o velho me pediu para parar para mijar (pa-pa-pa-para-pa-ô),
parei logo no primeiro posto, não queria que ele se mijasse uma gota sequer no
meu carro, ou íamos feder incontinência azeda por mais tempo que gostaria (que
é zero, hei de destacar caso não seja óbvio), abastecia o tanque e vi tua arma na cintura
das calças, enquanto saía do carro. (...)
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